terça-feira, 17 de maio de 2011

Opinião possivelmente atrasada sobre o livro didático dos "erros"

Assisto meio desconfiado à última polêmica linguística nacional. Com a pluralidade que lhe é peculiar, a "grande" mídia vem metralhando o livro Por Uma Vida Melhor, distribuído a milhares de estudantes pelo MEC, por "ensinar o aluno a falar errado". Pela internet afora assisto também colegas e amigos concordando com o suposto escândalo.

Não vou entrar nos detalhes técnicos, porque tem gente mais adequada fazendo isso já. Mas eu, que sou um mero usuário da língua portuguesa, tenho minhas teorias a respeito da dita cuja, então gostaria de levantar algumas questãs. Se tudo correr bem, a galera aqui, de linguistas, adevogados e publicitários, acorda com a polêmica.

Primeiro, nas matérias que eu li a respeito, vi pouquíssimas citações do texto original. Não sei que interesses poderiam ter vários veículos pra criticar um livro didático todos ao mesmo tempo, imagino que seja só pra pegar uma carona irresponsável na polêmica. Mas metralhar o Bin Laden e sumir com o cadáver dessa maneira, acho meio esquisito. Felizmente a internet tá aí pra entregar tudo pra quem quiser, tipo o pdf do capítulo polêmico.

A seguir, quero fazer uma comparação com a recém-aprovada lei anti-estrangeirismo do deputado Raul Carrion e as reações a respeito. Naquele longínquo Abril houve muita piada na internet e uma certa neutralidade nas matérias (porque não dá pra fazer piada em matéria séria, né?). Pergunto: porque a mídia se esquiva e a galera se emociona pra defender o inglês e pra atacar o brasileirês junta quase todo mundo? "90% off" é mais certo do que "os guri"?

E então chegamos aos mamilos do texto: não sei se é um fenômeno só de Pelotas e região mas, que eu me lembre, ninguém usa todos os plural das palavra. Ignorar esse fato numa aula de português tem a mesma utilidade de ensinar a escrever os porquês ou usar as "clises": nenhuma. São regrinhas que já fazem hora extra na língua portuguesa.

Se eu entendi a intenção do livro (não, eu não abri o pdf), ele não ensina a falar errado, como diz a manchete ali, ele simplesmente ensina que existem várias maneiras de falar. E diga-se que nenhuma em lugar nenhum corresponde à língua escrita. Se eu entendi direito, ele ensina a pluralidade de raciocínio, muito mais útil que os plurais das palavras. E faltando um pouco no jornalismo.

Aliás, onde que eu errei ali em cima, em "assisto à polêmica" ou em "assisto colegas"?

21 comentários:

José Antonio Magalhães disse...

Hahhah! Tem uma foto do Adoniran no livro! Só por isso já ganhou pontos

Bueno, mas vejamos

Eu concordo com a história de que, do ponto de vista linguístico (ou, melhor dizendo, do ponto de vista de como funcionam as palavras, já que não entendo de linguística) não faz sentido falar em língua certa ou errada senão do ponto de vista de se ela passa ou não a mensagem. O cara que li que fala sobre isso é o Wittgenstein e concordo com ele que as palavras não têm sentido senão aquele que suscitam na pessoa que as escuta

Até aí tudo bem, mas disso passar a achar que é bom o livro dizer pras crianças que "os pão" não é errado são outros quinhentos, e acho que é simplesmente por uma questão de legitimação. Como todos sabemos, ninguém vai deixar de aprender que se fala "os pão" pela rua, mas também, justamente por isso, não é preciso ensinar pra criança dentro do colégio que se pode dizer "os pão". Essa legitimação não precisa vir de dentro da escola. E acho um pouco radical e inconsequente dizer que dá na mesma contanto que seja entendível pra essas coisas. Eu não falo "os pão" e me dói o ouvido quando as pessoas falam, simplesmente porque a linguagem tem certas propriedades lógicas, por exemplo que "os" indica um plural e que "pão" indica um singular, de modo que qualquer pessoa com consciência lógica da linguagem vai sentir uma quebra aí

Em suma, sou a favor do Adoniran dizer "tauba de tiro ao álvaro" e do Apanhador Só não conjugar corretamente a segunda pessoa do singular, porque é uma linguagem que tem a sua realidade e a sua beleza, mas eu não acharia a menor graça se eles tivessem aprendido isso na escola, e ainda prefiro que as pessoas usem, mesmo na rua, as concordancias mais adequadas possíveis, enquanto isso for prático

José Antonio Magalhães disse...

Mais uma coisa: hoje mesmo estava comentando com a Laurisse que nunca aprendi a usar próclise e ênclise direito, mas isso não significa que seja inútil saber. Elas existem por motivos práticos de fluência do texto e, dependendo da modalidade de texto, eu gostaria de usar elas direito

Quanto aos porquês e aos consertos, a minha opinião sempre foi que é perfeitamente idiota terem inventado uma diferença na grafia quando a linguagem funciona na base do som, e o som é igual

No fim das contas, acho que nem sempre dá pra presumir que a linguagem vigente tem uma boa razão de ser. Ainda assim eu prefiro ir fechando com ela por enquanto (e emplacando as transgressões das quais sou partidário quando cabem) do que advogar a putaria total

Unknown disse...

É isso aí, Robertinho. Achei massa o texto!

E mais uma vez, seguindo as vibes das aulas de literatura francesa, discordo do Tom.

Primeiramente, não acompanhei muito, mas até onde sei de qualquer discussão nesse sentido (pelo menos as que fazemos nas Letras), o objetivo nunca é ensinar ninguém as variantes não-padrão; é claro que o objetivo da escola é a ascensão social, que se torna mais possível através do domínio da linguagem, etc. O objetivo é acabar com as ideias opressoras de que existe um modo certo de FALAR, o que não é verdade. Exite apenas o modo mais privilegiado. A intenção é, então, mostrar aos alunos que existem várias maneiras, sendo elas adequadas ou inadequadas dependendo da situação.

O que se pensa sobre um novo ensino do português é que se possa refletir sobre a linguagem e não ficar nessa de aprender conceitos. Tanto que tu mesmo, Tom, disse (e não disseste, eca) que não sabe usar próclise e ênclise, e isso é porque te ensinaram regras e não usos. Em casos mais graves(diria que a maioria), isso se manifesta nas coisas mais simples possíveis: ou seja, tem algo errado aí.

Outra coisa: usar apenas um plural é muito lógico sim! Tu faz isso falando francês e aposto que acha lindo. É questão de economia linguística. Se já disse que é mais de um guri no artigo, pra quê seguir dizendo que é mais de um? Saca? Isso é sim regra gramatical, e isso faz sim muito sentido. Nada de putaria.

Deixando claro, antes que tu, Tom, venha a interpretar mal: é óbvio que é papel da escola mostrar que na escrita e que em certas ocasiões orais deve-se usar todos os plurais. Mas é papel também mostrar que essas pessoas sabem sim português, e que essa língua pertence à elas, e não ao Pasquale Cipro Neto.

Unknown disse...

Ai, devia ter lido o texto do Marcos Bagno, linkado pelo Robert, antes de comentar. Li agora e vi que no meu comentário pareço um papagaio repetindo. haha É que essa história é batida!

Anônimo disse...

questões*, não questãs.

Robert Snows disse...

Dou um rolo de papel higiênico de presente pro anônimo se ele descobrir a outra palavra escrita errado no mesmo parágrafo.

Biscoito disse...

Concordo com a Eduarda, sejE lá quem for.

Como tenho interesse pelo início da alfabetização escolar, sei que o conceito de erro proposto pela escola acaba diminuindo a criatividade das crianças. A criança que sabe formar palavras e frases escreve de formas "erradas", obviamente, por não ter todo o sistema lexical de um adulto, mas ela cosnegue comunicar-se como tal. Ao tratar essa linguagem específica dela como ERRO, a criança acha que não sabe a língua que fala e para com construções ricas em conteúdo.

O próprio Bagno comenta sobre isso em um livro dele, assim como outros tantos artigos dele contra a tal gramática normativa que tantos adoram, mas que quase ninguém fala (pra não dizer ninguém).

Também não vi o pdf, mas acho muito improvável que o MEC vá ensinar que a linguagem popular seja a correta e dizer que essas inadequações são totalmente aceitas. O papel da escola é demonstrar ao aluno que existem várias variedades da língua portuguesa e que uma delas é considerada culta, aquela registrada na literatura (pré-Modernismo, claro) e em documentos oficiais.

O comentado sobre os artigo no plural, é bem isso aí mesmo. Pra que marcação em todas as palavras?! "As casas amarelas" é a mesma coisa que "As casa amarela"; a gente sabe que é mais de uma casa pelo artigo. Assim como concordâncias verbais e o diabo aquático.

Enfim, nem queria ter escrito tanto porque tô me preparando a escrever um artigo sobre algo semelhante, e provavelmente eu acabe me equivocando...
BJuX!

Anônimo disse...

vou falar com meus adevogados pra pegar o papel higiênico prometido.

Unknown disse...

E ah, como ninguém respondeu à pergunta do Roberto:
no nosso português do dia-a-dia, "assisto colegas", "assisto a polêmica";
na gramática normativa, "assisto aos colegas", "assisto à polêmica".

Aline disse...

Apoiado, Roberto. Pelo que vi (tb não abri o PDF) o livro fala da pluralidade, das diferentes possibilidades e momentos de fala. O Marcos Bagno faz uma análise bem boa do assunto http://marcosbagno.com.br/site/?page_id=745
Mas tua comparação com a gritaria pelo projeto do CarryOn está excelente. Que mania de nadar em cardume. A troco de que isso foi parar no agendamento? Como uma coisa dessas pode ter agendado todo um sistema comunicacional? Em vez de congratular o MEC por iniciativas congruentes com o que se estuda em sociolinguistica, chamam os gramatiqueiros para fazer marketing da língua de ontem.

Robert Snows disse...

Heahuiae saudoso Raul Carniça.

Aliás, tobregado Duda!

Nic Hck disse...

Esperava mais de ti, Tom.
Até pokemon evolui, não vai ser a lingua que vai se manter estática. O corte dos plurais nada mais é do que isso acontecendo aí na tua frente, e te prendendo ao "português correto" não tás fazendo nada além de atrapalhar essa evolução, claro, não vai ser da noite pro dia que essas "alteração" serão "aceita" pela maldita norma culta, mas com toda certeza esse dia chegará, tu falando cheio de s's ou não.

P.S. A Duda só me dá orgulho!!

José Antonio Magalhães disse...

Demorei pra responder porque eu estava ocupado e depois viajando, mas como a maioria dos comentários discordaram do meu ou tiveram algum problema de interpretação, vou tentar fazer umas respostas. Deu até vontade de fazer um post próprio sobre isso, mas aí fica pra depois. Em primeiro lugar, vocês não me levem a mal

Mas reparem, em segundo lugar, que eu não sou de jeito nenhum contra o uso informal da língua, tanto é que o meu próprio comentário tem várias expressões que seriam consideradas erradas pra uma norma culta. Mais do que isso: se vocês repararem, ninguém realmente usa a norma culta, de modo que eu não entendo direito o que querem dizer com essa história de criticar o uso quotidiano da norma culta, sendo que ninguém, pelo menos que eu conheça, a usa

Acho que o erro mais óbvio que alguns de vocês podem ter feito é me colocar do lado da crítica superficial da mídia, como se só existissem esses dois lados, quando na verdade a questão é, como geralmente essas questões são, mais complexa e eu estou, como geralmente eu estou, numa certa zona intermediária, ou seja, nem tanto ao mar nem tanto à terra

Eu acho que pode parecer, pra quem lê essas coisas que eu escrevo, que o próprio tipo de escrita que eu uso é pernóstico, porque é bem diferente da fala quotidiana, e pô, eu tento bastante até me aproximar dela quando dá porque acho que é muito legal, e certas pessoas como o nosso companheiro Roberto fazem essa aproximação absurdamente bem e com pouquíssima perda de poder de expressão, mas é que, na maioria dos casos, acaba que se eu tento usar uma linguagem escrita sem nada que fosse soar esquisito em uma conversa informal, eu realmente acho que ia ter dificuldade em me comunicar

Porque é óbvio, e eu acho que se vocês forem observadores vão perceber isso, que a linguagem quotidiana é muito frequentemente capenga para expressar idéias mais complexas. Por isso que eu fico com os dois pés atrás com essa história de todo o mundo de repente chegar falando como se as impropriedades que nascem na linguagem popular sejam sempre ou principalmente formas de evolução da linguagem. O pensamento, a formulação de idéias mais complexas e a comunicação delas, são constituídos e dependem diretamente da linguagem. Dizer que puxar as pessoas pra uma linguagem mais culta é oprimir elas é uma forma de opressão, pra mim, parece ter o efeito inverso, porque o que preconiza e solidifica a opressão é não dar a elas essa ferramenta importantíssima que é o domínio de uma forma mais formal de linguagem (dup)

José Antonio Magalhães disse...

Aliás, quanto a essa questão da opressão, eu acho que vocês estão se deixando levar por um discurso cheio de teoria da conspiração e demagogia, demagogia esta que é uma das principais características das forças dominantes no nosso país hoje e contra as quais os nossos supostos intelectuais andam tão, por assim dizer, atenuados

A teoria parece ser, basicamente, que a existência de uma norma culta da língua é um artifício das elites dominantes para excluir as pessoas que não dominam a língua. Essa teoria não só esquece da importância da língua como ferramenta contra a opressão como, mais importantemente, esquece que a nossa elite dominante hoje não é uma elite intelectual, e obviamente não é uma elite intelectual. Os professores e os acadêmicos são os fudidos e mal pagos, enquanto os detentores do dinheiro, totalmente ignorantes, e que estão longe de falar um português correto, são as elites dominantes. Quem acha que é por não ter condições financeiras que as pessoas falam errado provavelmente não frequentou colégio particular como eu frequentei, ou se frequentou não se lembra da língua tosca que as pessoas falavam, e que falavam por total desinteresse em falar de outra forma

Mais que isso: se é pra falar de exclusão, eu digo pra vocês que a minha vida inteira eu me senti intimidado de falar certas coisas de uma forma mais parecida com a norma culta por achar que, aí sim, eu iria sofrer preconceito. Porque é muito mais assim hoje do que o contrário: a gente sente vergonha de falar direito. Eu gosto, por exemplo, de falar tu fizeste, tu escreveste, etc., mas só recentemente ando tendo a pachorra de encaixar isso nas minhas frases, e ainda com um t muito tímido, quase mudo

José Antonio Magalhães disse...

Mas eu quero me retratar, ou no mínimo me explicar melhor em relação a uma coisa: beleza, não acho que seja ruim ensinar aos alunos que não existe uma linguagem realmente errada e que o que existem são contextos normativos que são relativos. Concordo com isso, do ponto de vista filosófico, e acho que deixei isso bem claro no início do meu primeiro comentário

Mas a minha questão é se eu acho ou não que precise ensinar isso no colégio ao mesmo tempo que se ensina o básico da língua. No meu outro comentário, eu disse que achava que era ruim, mas OK, escuto vocês e vou voltar atrás: talvez não seja ruim. Quero dizer, se o efeito for mesmo que as pessoas tenham consciência de que isso tudo é relativo e que a normatividade da linguagem é apenas uma ferramenta que eles podem ou não usar, beleza, acho isso muito válido, e acho que o Roberto colocou muito bem: pluralidade de pensamento. Inclusive, podiam aproveitar e começar a ensinar isso quanto a outras coisas no colégio, por exemplo quanto ao método científico ou à própria questão do conhecimento em geral, que no meu tempo não era colocada em cheque absolutamente nunca

Meu medo e o motivo de eu ter inicialmente me colocado contra isso era só o seguinte: pelo meu contato com pessoas ao longo da vida, a minha impressão é que dizer pras pessoas, dentro de um contexto inicial assim, que não existe certo e errado, seria muito facilmente entendido como um aval para deixar a linguagem culta de lado, considerar que ela é opressora, que não é útil, que é menos evoluida, e outras coisas que até vocês, meus amigos com acesso ao conhecimento, estão assinando embaixo agora mesmo

Se o ensino em geral fosse bom o suficiente para que as pessoas, no momento em que são expostas a estes questionamentos, já estivessem com uma maturidade suficiente para entender o que isso significa, eu acho que seria bom. É só que eu não acho que o nosso ensino em geral se paute por esse nível de consciência e criticidade que supostamente é a exigência neste caso, e que esse questionamento, embora válido, teria seu lugar num âmbito onde as pessoas pudessem realmente o absorver no seu sentido produtivo

Se não houver esse problema, ou seja, se for realmente pras crianças terem criticidade, mas continuando com o devido apreço pela língua formal que aprendem na escola, eu me retrato e digo que é legal que se ensine essa desconfiança da norma culta, que desconfiança pra mim, em estado bruto, sempre é bom. Só não sei se é esse o caso

Porque se for para se perder o apego pela linguagem que até hoje foi tida como correta, eu acho extremamente pouco perceptivo dizer que isso geraria uma evolução da linguagem. Digamos que algumas das supostas deturpações da linguagem são boas, por exemplo, digamos que é boa a suposta economia gerada pela supressão dos plurais. Certo. Agora vamos pegar as pessoa que fala assim e ver se, junto com essa suposta evolução, as outras modificações da sua linguagem em relação à linguagem tradicional são evoluções e se ajudam elas a se expressar e a pensar com clareza. A resposta a essa observação é obviamente que não, que na linguagem que rola pelas ruas, junto com essas deturpações, vêm uma série de deturpações e simplificações que diminuem drasticamente a riqueza da língua, que não é uma riqueza fútil e de luxo, e sim uma riqueza de pensamento e comunicação

José Antonio Magalhães disse...

Alguns exemplos ilustrativos:

Adoniran Barbosa, sambista de origem pobre, que evidentemente tinha leitura e sabia escrever bem em português, mas que usava sempre na sua música uma série de maneirismos e deturpações da linguagem popular. Ele usava essas deturpações sem a menor perda da complexidade lógica da linguagem e, mais do que isso, acrescentava um monte às capacidade de comunicação do tipo de coisas, de situações, de que ele tratava

O antropólogo da televisão, que não erra os plurais, que usa palavras bonitas, mas que não consegue falar um minuto ou expressar uma idéia sem uma frase-feita, que fala "o homem ele é mamífero" e "nós vamos estar pesquisando". Essas sim, muito mais que as deturpações assimiladas pelo Adoniran, fodem com a capacidade de pensamento de uma pessoa

A pessoa do povo. As pessoas sem oportunidades de hoje que, expostas a essa linguagem lixo e cheia de frases-feitas que a nossa televisão e as próprias pessoas, propagam, acabam falando não só com impropriedades inofensivas como com um monte de perdas que realmente acabam com a possibilidade delas formularem as coisas direito, e quem repara nesse tipo de coisa percebe esse problema. Quem se preocupa com essas pessoas deveria querer que ele se resolvesse

Chico, Vinícios, Drummond, poetas e intelectuais que, embora falassem uma linguagem totalmente popular na frente ou atrás das câmeras, dominavam e usavam artisticamente um português correto de dar inveja, por perceberem o quanto de bonito e de útil ele pode ter, e é claro que não julgavam que a linguagem que usavam cotidianamente era errada para essas coisas

Só o que eu queria dizer com isso é que dizer, simplesmente, que querer ensinar o português formal é só uma imposição antiquada e inútil, que é uma forma de opressão, que impede uma suposta evolução da lingua, é deixar de prestar atenção a como todas essas coisas realmente acontecem e evoluem na prática, e é principalmente simplificar demais o que não é tão simples, além de ser uma prepotência diante de coisas que acompanharam por tanto tempo tantas pessoas críticas, criativas e pensantes

José Antonio Magalhães disse...

Acho que boa parte das respostas que eu queria dar aos comentários já dei até aqui, mas agora vou ir lendo eles e vendo o que eu ainda posso acrescentar ou reiterar em minha defesa

@duda

Não precisava dizer que discordava de mim! Podias só ter dito que tinhas um ponto de vista diferente sobre o assunto! Brinks

Mas ainda fazendo referência às nossas conversas sobre etiqueta na argumentação, achei bizarro dizeres que "tu faz isso falando francês e aposto que acha lindo". Parece que eu sou um deslumbrado que acha que tudo que for em francé é legal, e isso obviamente não tem nada a ver com o meu patê

Mas dizes que usar o plural não é contra as regras da lógica, e é realmente bom o argumento e eu não tinha me dado conta disso. Ainda assim, acho que basta eu dizer que não é contrário à lógica de qualquer linguagem, e sim contrário à lógica da nossa língua. Eu falo português e, como a lógica inerente ao português (e toda a língua é convenção) é que o plural deve se repetir, ver um dos plurais faltando dá sim uma quebra para quem tem consciência da lógica da nossa língua, pelo menos na forma como atualmente ela existe

Isso não exclui que possam haver mudanças com o tempo e que o português poderia, eventualmente, evoluir para um estágio onde a lógica dos plurais fosse outra que, segundo vocês dizem, é mais econômica. Isso, de uma forma ou de outra, tem que acontecer naturalmente, só que isso não significa que toda a deturpação que o povo gerar vai ser uma evolução

Na verdade, esse argumento de que a normatividade impede a evolução da língua esquece o fato óbvio de que, até hoje, a língua evoluiu, justamente com base nessas deturpações, a despeito de toda a normatividade que imperava em épocas mais conservadoras. As mudanças vão ocorrendo e eventualmente são absorvidas pela norma culta. Não é a existência ou não dessa norma a ou do seu ensino que vai impedir essa evolução

Além do mais eu tinha lido o texto do Bagno antes do meu comentário, e não sei por que me explicar de novo essa questão toda da relatividade da língua, que não existe certo e errado, que não se deve fazer as pessoas se sentirem mal por falarem diferentemente. Tudo isso eu sei e concordo e está pressuposto no que eu estou dizendo. Queria que vocês prestassem um pouco mais de atenção antes de achar que eu estou dizendo coisas idiotas que não estou

Mais uma coisa: tudo bem que a omissão do plural é lógica, mas quero ver por exemplo me explicares a lógica possível para aquela crase no final do teu primeiro post. Te peguei!

@biscoito

Concordo com o teu primeiro parágrafo e isso me leva a pensar que pode ser bom mesmo expor, mesmo pra crianças pequenas, essa questão de que não existe erro. Ainda assim, acho que precisa muito cuidado, porque é muito fácil confundir isso com um desprezo da língua culta, tanto é que até aqui mesmo, entre gente grande, está se fazendo essa confusão

Voltando à coisa de se as casas amarelas é o mesmo que as casa amarela, tudo bem, ainda admito que uma língua poderia ser assim e ser perfeitamente lógica, mas fico pensando que não entendo também esse desprezo pelas características que são peculiares da nossa língua. Nenhuma língua é perfeita e todas têm excessos e coisinhas desnecessárias. São essas coisas que diferenciam uma língua da outra, dão suas características, fazem com que umas tenham seus prós e seus contras. Se mudássemos isso faríamos várias economias ao digitar e falar, de uma letra ou duas por palavra, mas perderíamos alguma coisa. Como iria passar a se chamar, por exemplo, aquela música chamada Maneiras?

As concordâncias verbais é a mesma coisa, nos obrigam a conjugar verbos mas nos poupam de repetições de artigos e pararás. Cada língua é do seu jeito, e eu sou contra podar essas características em nome de uma suposta economia lógica, que não chegaria nunca, evidentemente em uma linguagem lógica pura, que nem o Bertrand Russel deve ter morrido achando que isso existia

José Antonio Magalhães disse...

@duda de novo

Sobre a resposta ao roberto: Ah, então existe um correto para o português do dia a dia? Estou me sentindo oprimido! Peguei de novo!

@aline

Não sei quem é a Aline no caso, mas só pra dizer de novo que eu não consigo gostar dessa idéia que geral está passando de "língua de ontem". Quero saber qual é a língua de hoje e se vocês, podendo, passariam todos os livros, todos os poemas, pra essa nova língua. Não entendo pra que o desprezo e acho até uma prepotência

@titanic

Pra repetir de novo: não acho, nem nunca achei, que a língua deveria ou poderia ficar estática. Só estou tentando levantar algumas questões porque não gosto que se coloque tudo no mesmo saco, como o pessoal é tendente a colocar. Se vocês esperam mais de mim (e eu espero que esperem, porque eu tento não ser superficial a respeito das coisas em geral) deveriam pelo menos presumir que eu não estaria falando uma merda tão grande quanto vocês às vezes acham à primeira vista!

Agora, normatividade é dizer que eu falando meu português correto estou atrapalhando a evolução e que sou obrigado a falar um português que, só porque é da maioria, deve ter a presunção de ser mais evoluído. Se o português da maioria for, em certos aspectos, mais evoluído, as pessoas com cultura e capacidade e criatividade vão adotar e as coisas vão evoluir. Só não faz sentido querer me convencer ou convencer a si mesmo que existe uma racionalidade foda inerente às massas que vai evoluir a língua, que não existe, e nem sempre o que deixa de ser usado da linguagem culta é porque é supérfluo. A maioria das vezes, é simplesmente porque as pessoas não têm oportunidade de desenvolverem mais a linguagem, e isso é uma merda

Escrevi pra caramba, porque acaba que dá menos trabalho do que ficar planejando e fazendo um texto sucinto e organizado, e não sei se alguém vai ler, mas pelo menos queria afastar a presunção de que eu fosse tão babaca quanto vocês parecem achar que eu sou. Não levem a mal eventuais grosserias que podem ter escapado no meio do texto, que escrevi rápido e sem formular melhor essas coisas

Unknown disse...

Tom, que texto gigante. Cansei já no primeiro comentário, desculpa a sinceridade. Tem aí uns quantos argumentos que eu contra-argumentaria, se tivesse paciência de reler um texto tão grande.

Acho que tu entendeu mal umas quantas coisas, então podemos conversar depois. Mais uma vez, se eu quisesse voltar no teu texto agora, acharia vários argumentos a meu favor.

Neste momento, só quero que uma coisa realmente fique clara: ninguém disse que a norma culta era opressora. A opressão vem de uma noção de que pessoas sem acesso a ela não sabem FALAR português. Ou seja,tu baseou teu comentário numa ideia que todos nós sabemos e concordamos (tanto que expressei no meu primeiro comentário): a função da escola é ensinar o domínio sobre a linguagem, e é óbvio que aí entra ensinar a norma culta. Acho que quem colocou tudo no mesmo saco foi tu.

Uma coisa é mostrar que existem diferentes formas de falar e que todas devem ser respeitadas. Outra é o que vai se ensinar na escola, no que se refere às expressões orais e escritas, que é óbvio que vai ter como base a linguagem padrão.

E a evolução tá se dando e ninguém tá achando que a norma culta "atravanca" alguma coisa, ou que deva ser negligenciada. E não senti desprezo por parte de nenhum dos comentários com relação a ela.

E mais um monte de coisas que podemos conversar depois.

Não gostei dessa posição de vítima: tu falou uma coisa, a gente interpretou e argumentou em cima.Foi isso. Nada de "o Tom é mongolão". Acho que é fácil dar uma de mal-compreendido. Desculpa de novo.

Quanto a me "pegar": Na primeira, foi erro. E daí? Poderia apontar alguns erros de concordância no teu texto, entre outras coisas. Grandes coisa.

Na segunda, peço que tu volte ao meu comentário e veja que nunca tratei nenhuma das duas maneiras como erro. Mostrei que eram diferentes,sem hierarquia alguma.

Não me senti "pegada" de nenhuma maneira, a não ser pelo fato de ter usado o teu famoso e irritante "discordo do..." no início do meu comentário. Aí, talvez sim. :)

José Antonio Magalhães disse...

@duda

Não sei por que não achaste que as pessoas estejam tratando a norma culta como sendo opressora, nem que ela atravanca o progresso, porque eu vi isso em uns quantos lugares

Mas eu disse isso também, que não acho que se deva dar às pessoas a idéia de que não sabem falar português, e eu sei que esse é o objetivo da coisa. A questão que eu levantei, bem entendida, é como essa boa idéia pode gerar a consequência ruim, na prática, do desprezo pela norma culta. Se leres o que eu escrevi vais ver que é isso que eu estou dizendo: que as pessoas podem não estar preparadas pra entender que a norma culta segue sendo importante, tanto que tenho visto, e vi aqui, vários ataques sim à norma culta

Eu não estou tantando dar uma de mal-compreendido como efeito de discurso, oras. Só estou dizendo que achava que estava sendo mal compreendido. A parte importante do que eu tou dizendo está nos argumentos, obviamente

Quanto à crase, eu falei aquilo não pra dizer que não podes errar, mas pra chamar atenção ao fato de que nem todos os erros de português comuns representam alguma simplificação lógica ou evolução, e que nem sempre eles mantém qualquer lógica. Muita gente erra crase e erra justamente por deixar de prestar atenção à lógica da linguagem, porque crase, diferente de coisas ortográficas, é algo a que se chega por uma lógica

Quanto ao segundo comentário, eu acho que dizer "no nosso português do dia a dia é assim" implica que existe não só um certo da linguagem culta como um certo do dia-a-dia. Obviamente seria uma opressão desnecessária dizer que o certo do dia-a-dia é falar necessariamente diferente da norma culta. Como todo o mundo estava dizendo, no dia-a-dia eu posso falar como eu quiser, desde que me faça entender

Robert Snows disse...

Eu ia ficar quieto, mas o discurso do Tom tocou fundo no meu coração e me deu umas coisas a acrescentar.

Antes de mais nada, quero agradecer ao aparente elogio do Tom à minha técnica esquizofrênica de escrita, devo tudo a Mad, Herói, Animax, Rock Brigade, aos tradutores da divisão de quadrinhos da Editora Abril e ao déficit de atenção.

Dito isso, quero levantar mais umas questãs que se pá o Tom poderia desenvolver posteriormente.

Segundo eu entendi, o que ele defende - e isso é uma coisa bem complexa de se fazer -, não é "o outro lado", e sim a possibilidade de o "meu lado" estar errado ou conter problemas. Eu faço isso seguido, é uma chatice pra explicar. Como já dizia um ídolo meu, onde houver fé, que eu leve a dúvida. Mas isso também não significa que eu concordo com o que foi dito.

"(...)pluralidade de pensamento. Inclusive, podiam aproveitar e começar a ensinar isso quanto a outras coisas no colégio(...)". Me lembrou o professor de MATEMÁTICA do CPV, que dava discursos sobre isso. Não sei se é vivo, mas era um poeta.

"Agora vamos pegar as pessoa que fala assim e ver se, junto com essa suposta evolução, as outras modificações da sua linguagem em relação à linguagem tradicional são evoluções e se ajudam elas a se expressar e a pensar com clareza. A resposta a essa observação é obviamente que não(...)". Não sei se essa relação funciona nesse sentido, mas é algo a se pensar. Me lembrou aquele livrinho em que o governo, pra limitar o raciocínio da galera, diminuía a quantidade de palavras.

Tá, era isso.